quinta-feira, 29 de agosto de 2013

O apagão na Câmara dos Deputados Federais

O apagão na região nordeste ganhou as manchetes na tarde de 28 de agosto, não somente pelos prejuízos incalculáveis à economia, mas também pelos danos físicos e morais que decorrem da falta de energia, num mundo que gira em torno das turbinas de hidroelétricas.

Prejuízo maior, porém, ocorreu no final da noite do mesmo dia, no plenário da Câmara dos Deputados em Brasília. Escondidos sob a máscara do voto secreto, a maioria dos representantes de interesses corporativistas, por ação ou omissão, decidiu manter em seus quadros o primeiro deputado federal - Natan Donadon (PMDB-RO) - condenado pelo Supremo Tribunal Federal, na “Nova” República.


A população, talvez com os olhos fitos nos jogos de futebol da quarta-feira à noite, pareceu não se dar conta do que significaria o atentado cometido pelos deputados contra o país. Não percebeu, pelo menos não a julgar pela inicial falta de reação, o significado ético e político da referida decisão.

Primeiro, a decisão indica que, no Brasil, nem todos são iguais perante a lei. Ora, se o STF condena um indivíduo, depois de um processo que levou anos tendo o réu todas as chances de se defender; se vivemos sob a “Lei da Ficha Limpa” que impede condenado por órgão colegiado a candidatar-se; se um funcionário público pode ser demitido após sentença judicial transitada em julgado, como podem os deputados preservar como representante do povo um criminoso que já está atrás das grades?

Segundo, a decisão não afirma o legislativo como um poder independente, mas como um poder que afronta o povo que deveria representar, que desrespeita a decisão daqueles que têm o poder para colocar atrás das grades qualquer indivíduo julgado e condenado, independente de serem ou não, os juízes, susceptíveis – e são – de influências políticas.

Terceiro, a decisão indica desrespeito aos milhões de empobrecidos deste país que trabalham e pagam impostos não para sustentar família de criminoso com prestígio, que está atrás das grades, mas na expectativa de ter melhor saúde, educação, segurança, etc.

Quarto, a decisão indica à sociedade que o crime compensa. Que um indivíduo é condenado por ter roubado milhões do dinheiro de altíssimos e sem retorno impostos pagos por nós, não devolve um centavo – até onde ouvi -, e sabe que, após passar alguns anos atrás das grades, voltará ao cotidiano e usufruirá do fruto do seu ato criminoso para o resto da vida.

Quinto, a decisão confirma o que a população já percebeu: se eles mantêm em seus quadros um bandido, quando poderiam expurgá-lo, isso evidencia um ato de precaução a favor de si próprios, por possível consciência (consciência?) de rabo preso.

Sétimo, a decisão indica um total desrespeito ao mínimo de postura ética esperada por aqueles que são eleitos para trabalhar por um país mais justo, no qual a corrupção deveria receber adequada e exemplar punição.



Lamento, profundamente, a decisão dessa quarta-feira, 28 de agosto e, em meu círculo de relacionamento, me empenharei para transformar esse lamento em ações contrárias a esses “homens de máscara”, mais perigosos do que os chamados “vândalos de junho”, eleitos por nossos votos e sustentados pelo fruto do nosso trabalho, que cometeram tamanho atentado contra todo um país.

terça-feira, 27 de agosto de 2013

E eu com isso? (Insegurança, transporte, Igreja e valores espirituais)

No texto “Quién vació las iglesias”, o español Alfonso Ropero defende a tese de que o esvaziamento das igrejas na Europa não teria como causa o surgimento das teologias rotuladas como conservadoras ou liberais. Para ele, as teologias (maniqueisticamente) assim rotuladas, teriam surgido do esforço bem intencionado de teólogos cristãos, empenhados em responder a profundas questões existenciais que brotaram no coração do povo, decorrentes de fatores político-econômicos, como é o caso da Europa, assolada por duas guerras mundiais.

Ele defende, também, que as novidades intelectuais e teológicas não são causa de transformações sociais, são eco. As mudanças sociais acontecem de forma lenta e imperceptível movidas por “N” fatores e, somente depois, são conceituadas por acadêmicos e especialistas. As novidades teológicas seriam, então, mais produto do que agentes de mudanças.

Bem, em que pese o texto, disponível no meu blog, ser provocativo e bastante interessante pra quem lida com temas acadêmicos, inclusive teologia, não é sobre ele que quero escrever. Apenas associei-o ao que está acontecendo em nossa igreja. Vamos lá.

Neste primeiro domingo de setembro, depois de muita resistência, passamos a iniciar o culto do domingo à noite, trinta minutos antes. Alguns defendem que deveria ser 1h30 antes. Éramos uma das poucas igrejas com perfil semelhante ao nosso, em Salvador, que se mantinha fiel à tradição de 19h30. Razão da mudança? Mudança no perfil da cidade, decorrentes de novas realidades sociais.

Há oito anos e meio, quando cheguei a Salvador, o culto do domingo à noite tinha uma freqüência maior do que o da manhã. Hoje, pela manhã, pessoas ficam em pé, outras tantas desistem antes de estacionarem, enquanto o da noite teve a freqüência diminuída. Causa apontada? Aumento visível nos índices de violência e dificuldades na mobilidade urbana.

Ensaiar corais, bandas ou realizar reuniões nas noites da semana tornaram-se mais difícil. A mobilidade tornou-se um inferno e, como 80% da membrezia mora a mais de 5 kms de distância, com concentração de pelo menos 50% a dez, na região da Pituba, querer sair do trabalho, ir pra casa tomar banho e jantar, pra depois participar de ensaios ou reuniões, tornou-se cronologicamente impossível, em face dos gargalos de engarrafamentos na hora do rush.

A não participação, outrora justificada somente como falta de compromisso espiritual, ganhou um aliado de natureza social. A existência de cantina, antes criticada por alguns como “comércio no templo”, vai se tornando unanimidade. Até a famigerada e criticada impontualidade cultural ganhou um amigo: o trânsito.

Não é por acaso, por exemplo, que o tempo do brasileiro metropolitano em frente ao computador ou televisão é diametralmente oposto ao gasto na “calçada”, numa roda de amigos, ou mesmo participando de atividades na igreja.

Ao final de uma reunião com o governador do Estado, depois de alguém levantar a influência da inversão de valores espirituais nas manifestações de junho passado, lembrei que não há como separar cultivo de valores espirituais das realidades sociais. Sem transporte ou mobilidade de qualidade e em meio à insegurança, por exemplo, até mesmo a presença nos cultos é prejudicada.

Portanto, precisamos entender que não podemos fechar os olhos às realidades sociais. Discursos que fortalecem valores espirituais, sem empenho em ações que contribuam para torná-los realidade nas estruturas nas quais a vida se desenvolve, são como fé sem obras.

A mudança no horário do culto indica que estamos perdendo a “guerra” contra a violência, inclusive por ainda não equacionarmos adequadamente a relação entre interesses individuais e os da coletividade. Quem pode sufoca e se sufoca no “engarrafamento” com seu próprio carro e, quem não pode, se sufoca “enlatado” dentro de um ônibus ou se “enjaula” em casa. No final, todos estamos perdendo.


E eu com isso?

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Batistas e a Lei de Gerson

“Por que pagar mais caro se o “Vila” me dá tudo o que eu quero... ? Gosto de levar vantagem em tudo, certo? Leve vantagem você também...” (Gerson, da seleção tricampeã do mundo de futebol, em propaganda veiculada em 1976)

Ainda tenho na memória a escalação da Seleção Brasileira vencedora da copa de 70. Dentre os campeões, lá estava Gerson, o “canhotinha de ouro”. Infelizmente, lembro-me dele não somente pelas belas jogadas. Lembro-me, também, de que, em 1976, ele protagonizou um comercial de cigarros – atletas deveriam ser proibidos de fazer propaganda de fumo e bebida alcoólica – no qual popularizou um slogan que norteia a vida de muita gente, das quais, alguns batistas: “o importante é levar vantagem em tudo”.

A cultura da Lei de Gerson se consolida em nossas igrejas quando enfatizamos mais (e, pior, distorcidamente) Malaquias 3:10-11 do que II Coríntios 8 e 9 (NVI). Alguns enfatizam o dar para abastecer a “casa do Senhor” (leia-se, NOSSA igreja) e, como conseqüência, sermos abençoados com RETORNO garantido e multiplicado do NOSSO investimento.

Diferente, porém, era a ênfase paulina. Nela os crentes davam:
1.  Movidos pela graça (II Cor. 8:1)
2.  Em meio a severa tribulação e extrema pobreza (II Cor. 8:2)
3.  Dando o que podiam e além do que podiam (II Cor. 8:3)
4.  Insistindo para ter o privilégio de dar (II cor. 8:4)
5. Como consequência da entrega que fizeram de suas vidas a Deus( II Cor.8:5)
6.  Pelo simples privilégio de contribuir (II Cor. 8:7)
7.  Com sinceridade e dedicação ((II Cor. 8:8)
8.  Empobrecendo-se para enriquecerem outros((II Cor. 8:9)
9. Proporcionalmente ao que possuíam (II cor. 8:11)
10. Com prontidão, não hesitação (II Cor. 8:12)
11. De forma justa (II Cor. 8:13-14)
12. Porque os líderes eram éticos e zelosos na administração (II Cor 8:16-22)
13. Com objetivo de honrar ao Senhor (II Cor. 8:19)
14. Com generosidade, não com avareza ( II Cor. 9:5)
15. Visando uma colheita abundante para o Reino (II Cor. 9:6)
16. Não por obrigação, mas por alegria (II Cor. 9:7)
17. Visando acréscimo de graça e boas obras (II Cor. 9:8)
18. Visando atender necessitados, não a si mesmos (II Cor. 9:9)
19. Cientes de que Deus não deixaria que nada lhes faltasse (II Cor. 9:10)
20. Visando o aumento da generosidade individual e glorificação a Deus (II Cor. 9:11)
22. Visando suprir as necessidades alheias e aumentar o sentimento de gratidão (II Cor.9:12)
23. Como manifestação de serviço, testemunho de obediência e generosidade (II Cor. 9:13)
24. Porque o retorno seria o amor dos que eram abençoados (não aumento patrimonial próprio) (II Cor. 9:14)

Em termos denominacionais, o espírito de “levar vantagem em tudo” revela-se quando perguntamos: “que vantagem levamos ao cooperar com a Convenção?”, em vez de perguntamos: “quem estamos abençoando ou abençoaremos com a nossa cooperação?”. Convenção não é consórcio, muito menos Fundo de Investimentos. Não cooperamos para levar vantagem, mas para abençoar vidas. Daí as palavras de Jesus: “Mais bem aventurado é dar do que receber” (At.20:35).

Se os que estão administrando os recursos NÃO manifestam o mesmo cuidado manifestado por Paulo (II Cor.8:16-22), tenhamos a coragem de apontar o que precisa ser melhorado, de dizer como isso pode ser corrigido e, não havendo resposta, de destituí-los. Jamais, porém, usar isso para justificar atitude egoísta, egocêntrica, de quem só pensa em “levar vantagem em tudo”.

É verdade que, dentre as finalidades de uma Convenção, está a de apoiar as igrejas, equipando-as para melhor desenvolverem seus ministérios, o que deve ser feito, predominantemente, através da oferta de educação por suas organizações (no caso da Bahia, AECBA, AMUBAB, CENTRE, Integração Comunitária, JUBAB, Seminários, UFMB e UMMB).

A finalidade primeira dessas organizações não é, portanto, fazer o que é papel das igrejas, mas capacitar as igrejas para que façam ainda melhor. Se não cumprem seu objetivo, apontemos as deficiências, as soluções e nos disponibilizemos para fazer (até porque ficar num pedestal, à distância, apontando falhas dos outros é fácil!). Aos líderes das organizações, por nós eleitos, cabe planejar estrategicamente, avaliar e apontar caminhos. Seus cargos não existem como trampolim para carreira “ministerial”, espaço de manifestação de egos envaidecidos ou meio de angariar prestígio político visando benefícios próprios.

Pastor, se sua relação com a Convenção é na expectativa de levar alguma vantagem própria, é hora de rever sua relação com Deus e o próximo, à luz de II coríntios 8 e 9. Talvez nisto esteja a causa de problemas em sua igreja: os membros agem com ela, da mesma forma que seu líder com a Convenção.

Quando ouço de pastores que se beneficiaram de educação no mínimo subsidiada pela Convenção; que exercem ministério em igrejas plantadas com dedicação e know-how de outras igrejas; que se abrigam em templos construídos com esforço alheio e, da noite pro dia, sob alegação de desejo democrático dos membros, resolvem roubar esse patrimônio – história, gente, organização e prédios – visando seus próprios interesses, o que é isso senão uma manifestação da Lei de Gerson?


Creia: você e sua igreja não levam vantagem alguma sendo fiéis à cooperação denominacional porque não é isso que devem visar.  Se a finalidade de todos fosse essa, o sistema não subsistiria. A cooperação se mantém há séculos porque há batistas  - homens e mulheres - que não se dobram à Lei de Gerson. Sabem que, onde ela é tolerada, o resultado não pode ser outro: enfraquecimento e destruição do sistema.