segunda-feira, 27 de abril de 2009

Ameaça à cidadania da mulher batista


A mulher já passou por fases “curiosas” em sua história. Foi, por exemplo, impedida de conversar com homem em publico; rejeitada no nascimento pela crença de que filha não abria as portas do paraíso para o pai; obrigada a andar “empacotada” para não ser objeto do desejo masculino; proibida de usar calças compridas; impedida de votar sob a justificativa de que as obrigações domésticas dificultariam o exercício político; recusada em plano de saúde e no mercado de trabalho por causa de possível gravidez e até condenada a ficar calada na igreja.
Isso tudo seria coisa do passado se a história da humanidade fosse linear, mas não é. A história e escrita dia-a-dia e seus atores estão em constante luta para fazerem prevalecer vontades individuais ou de grupos. Isso acontece fora e dentro das igrejas.


("Burquines", variação menos comportada da "burca" para uso na praia")


Dentro das igrejas batistas associadas à Convenção, a mulher lidera organizações em todas as áreas, participa de conselhos e comissões, ensina em classes de seminários ou de EBD e faz palestras sobre temas diversos, por exemplo. Inegável, portanto, é sua contribuição à saúde e desenvolvimento das igrejas nas quais é valorizada.


Essa realidade, entretanto, está sob ameaça e isso não é ficção, senão vejamos:


Até aproximadamente 30 anos atrás, a Convenção Batista do Sul dos Estados Unidos, responsável pelo início da obra batista no Brasil, contava com mulheres ensinando em suas instituições teológicas e não eram discriminadas em qualquer das disciplinas oferecidas. Elas podiam ensinar na EBD, independente de presença masculina entre os alunos, ser educadora ou regente congregacional.


Com a mudança no comando da Convenção do Sul, no início da década de 80, os novos dirigentes articularam para que batistas com pensamento diferente dos deles não fossem eleitos para as “juntas administrativas” e assim conseguiram banir a diversidade e implementar a uniformidade em suas instituições. Alguns missionários que atuavam no Brasil tiveram que deixar o campo por não concordarem com esta política.



Isso foi feito sob o argumento de preservar a fidelidade às Escrituras, porém, uma outra maneira de interpretar a Bíblia foi imposta, mulheres passaram a ser impedidas de ensinar em alguns seminários e igrejas onde houvesse presença masculina e até proibidas de se matricularem em disciplinas - homilética, por exemplo – que, no exercício, as colocariam em suposta posição de autoridade sobre homens.


No Brasil, aliados deste tipo de pensamento se colocam apenas como fiéis defensores da inerrância bíblica, defendendo uma interpretação popular (ou literal, como dizem) dos textos sagrados, desconsiderando a cultura* no qual foram produzidos e posicionam-se contrários à consagração de mulheres ao pastorado, sob alegação chantagista de que isso seria uma porta para a aceitação de homossexuais na igreja.


Silenciam, entretanto, no que se refere à crença – e fato que vai se consumando - de que mulheres “devem aprender caladas na igreja”. Defender isso publicamente, sem primeiro assumir o comando das instituições que formam o pensamento denominacional (seminários e editoras), seria dar tiros nos pés.

Que ocorrências me fazem pensar no título deste texto?


a) cresce o número de pastores batistas envolvidos em conferências promovidas por organização que representa este pensamento no Brasil;


b) está se tornando comum, por parte de pastores batistas, o discurso da volta aos “pais reformadores”, como se o pensamento dos líderes do passado, especialmente os das reformas do século XVI e XVII, fosse homogêneo e celestial e a volta ao que eles criam fosse a vontade de Deus para a salvação do mundo;


c) há proposta sobre a mesa do Conselho da CBB de criar-se diretor único para os seminários nacionais batistas e também que os seminários da CBB firmem convênio com seminário norte-americano adepto desta linha de pensamento, “para o desenvolvimento do programa de pós-graduação lato e stricto sensu”;


e) sob o argumento da agilidade, busca de espiritualidade ou capacitação (buscas com as quais me afino), o cerco em torno da participação popular em nossas assembléias está se fechando e concentrando-se, cada vez mais, o poder decisório em fóruns com presença menor de batistas;




Não creio que tais ocorrências sejam fruto de orquestração como ocorreu na SBC. Mas nada custa alertar aqueles e aquelas que acreditam que todos somos igualmente filhos de Deus (Gal. 3.26-28), no sentido de estarem atentos, a fim de não permitirmos retrocesso na cidadania da mulher batista, através da aceitação de pensamentos doutrinários heréticos em relação à tradição histórica dos batistas.


Se não estivermos atentos, daqui a 50 anos, além do silêncio na igreja, as mulheres voltarão a usar véu, não poderão mais falar com homens em espaços públicos, terão lugar separado, em segundo plano, em nossas “sinagogas” e, quem sabe, aproveitando a moda afegã, serão obrigadas a usar “burca” (pois já há usuárias do véu!), de tão culturalmente “bíblicos” que seremos.


Com mais de 100 anos, estarei no céu, mas nossas netas viverão puríssimas, sob fundamentos “bíblicos” e atencipadamente, no inferno. Quem viver verá!


Cadê o sorriso enigmático de Monalisa?
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(*Leia, por exemplo, "A ordem estabelecida por Deus na criação", escrito pelo pastor batista Wilson Franklim e publicado n'O jornal Batista de 04.01.09)
Diante de texto como esse, resta-nos cantar:

sábado, 25 de abril de 2009

Liberdade, disciplina e prazer

(acervo de conteúdo livre da Wikimedia Foundation)

A música “Minha Vontade”, samba da Portela de Chatim, interpretada por Vânia Lucas (ex-aluna do STBSB) em seu agradabilíssimo CD, é um belo retrato daquilo que chamo de prazer da disciplina. Sua letra expressa algo que todos, em maior ou menor grau, almejamos: liberdade.

A letra diz:


Quero viver como passarinho
Cantar, voar, sem direção.
Quando eu quiser construir meu ninho
Hei de encontrar o coração.
Por enquanto eu quero viver
Com toda a liberdade
Saltando aqui, pousando ali
Essa é a minha vontade.
Não, eu não quero prisão
Para o meu coração, eu não quero
Será bem triste o meu fim
Se eu não conseguir
Levar minha vida assim.



O interessante é que não há como ouvi-la atentamente, construindo mentalmente as possibilidades de imagens que a letra desencadeia e experimentando o prazer da harmonia, sem pensar na relação do trinômio liberdade, disciplina e prazer, tendo a própria música como referência.

A execução inicial com voz e um único instrumento de percussão, exige disciplina rítmica entre quem canta e quem toca. A junção disciplinada de ritmo e sons produz uma imensa sensação de prazer, quando se ouve sem pressa, como quem degusta uma deliciosa manga madura.

De maneira suave, planejada, vão aparecendo piano, apito, violão, baixo acústico, bateria, tan tan de mão, tamborim, pandeiro, agogô, repinique, afoxé, ganzá, cuíca, surdo e o coro, tudo de forma milimetricamente disciplinada.

De repente, percebe-se que a liberdade de criação de cada intérprete é rigorosamente controlada, disciplinada, visando alcançar um interesse maior que é produzir uma harmonia tal que faz o ouvinte experimentar a sensação de liberdade interior. É a ação disciplinada daqueles que estão cantando a liberdade, que produz o delicioso prazer.

Lembro-me das vezes em que pude ouvir música ao lado dos meus filhos ainda crianças. Estimulava-os a prestarem atenção em cada instrumento musical usado e em como cada um, mesmo participando de maneira curtíssima, porém disciplinada, era essencial na construção da harmonia e da beleza musical. Bolero, de Ravel, é um dos exemplos contundentes de como isso se dá.


O investimento em disciplina é a garantia do prazer da liberdade. Ele “não parece ser de gozo, senão de tristeza, mas depois produz um fruto pacífico de justiça nos exercitados por ela.” (Hebreus 12.11). Assim acontece com a música "Minha Vontade". Ela pode falar de liberdade, mas, para que produza prazer em quem ouve, há muita disciplina da parte de quem a executa.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Joaquim Barbosa fala em nome do Brasil

Folha Imagem


Tudo que cada brasileiro gostaria de dizer ao Sr. Gilmar Mendes, através do Jornal Nacional, foi dito nesta quarta-feira, 22 de abril, pela boca do Ministro Joaquim Barbosa.
Veja o conteúdo:


Muito obrigado, Dr. Joaquim Barbosa

Juventude eterna

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Texto de Martha Medeiros
"Essa história que eu vou contar agora aconteceu com uma mulher inteligente que estava fazendo uma palestra. Diz ela: “Mês passado participei de um evento sobre o Dia da Mulher. Era um bate-papo com uma platéia composta de umas 250 mulheres de todas as raças, credos e idades. E por falar em idade, lá pelas tantas, fui questionada sobre a minha e, como não me envergonho dela, respondi.
Foi um momento inesquecível... A platéia inteira fez um 'oooohh' de descrédito. Aí fiquei pensando: 'pô, estou neste auditório há quase uma hora exibindo minha inteligência, e a única coisa que provocou uma reação calorosa da mulherada foi o fato de eu não aparentar a idade que tenho? Onde é que nós estamos?'”
Onde não sei, mas estamos correndo atrás de algo caquético chamado 'juventude eterna'. Estão todos em busca da reversão do tempo.Acho ótimo, porque decrepitude também não é meu sonho de consumo, mas cirurgias estéticas não dão conta desse assunto sozinha. Há um outro truque que faz com que continuemos a ser chamadas de senhoritas mesmo em idade avançada. A fonte da juventude chama-se mudança.


De fato, quem é escravo da repetição está condenado a virar cadáver antes da hora. A única maneira de ser idoso sem envelhecer é não se opor a novos comportamentos, é ter disposição para guinadas.Eu pretendo morrer jovem aos 120 anos. Mudança, o que vem a ser tal coisa?
Minha mãe recentemente mudou do apartamento enorme em que morou a vida toda para um bem menorzinho. Teve que vender e doar mais da metade dosmóveis e tranqueiras, que havia guardado e, mesmo tendo feito isso com certa dor, ao conquistar uma vida mais compacta e simplificada, rejuvenesceu.


Uma amiga casada há 38 anos cansou das 'galinhagens' do marido e o mandou passear, sem temer ficar sozinha aos 65 anos. Rejuvenesceu.

Uma outra cansou da pauleira urbana e trocou um baita emprego por um não tão bom, só que em Florianópolis, aonde ela vai à praia sempre que tem sol. Rejuvenesceu.

Toda mudança cobra um alto preço emocional. Antes de se tomar uma decisão difícil, e durante a tomada, chora-se muito, os questionamentos são inúmeros, a vida se desestabiliza. Mas então chega o depois, a coisa feita, e aí a recompensa fica escancarada na face.
Mudanças fazem milagres por nossos olhos, e é no olhar que se percebe a tal juventude eterna. Um olhar opaco pode ser puxado e repuxado por um cirurgião a ponto de as rugas sumirem, só que continuará opaco porque não existe plástica que resgate seu brilho. Quem dá brilho ao olhar é a vida que a gente optou por levar.

Olhe-se no espelho..."

terça-feira, 21 de abril de 2009

Sensibilidade impressionante

"Rosa é colocada sob arame nas proximidades do portão de Auschwitz, sul da Polônia (Foto: Peter Andrews/Reuters)" (fonte: Globo.com)

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Ele continua solto

João diz que ele é o pai da mentira; Raul Seixas, que ele é o pai do rock. Nos evangelhos é o tentador; para Rubem Alves, testador seria mais adequado. Na idade média era apresentado com chifre, rabo e garfo pontiagudos; hoje, como uma espécie de representante do ministério público. Para machistas seria uma linda e insinuante mulher; para “outros”, um discreto “cartão de crédito”.

Maligno, Diabo, Satanás, Inimigo, Serpente, Cramunhão, Dito Cujo, Capeta, Demo, Coisa ruim, Diacho, Belzebu, Travesso, Danado, Tinhoso, enfim seus nomes são tantos quantos as imagens que tentam representá-lo.

É tão comentado quanto negado, além de ser o supremo culpado. Quando não queremos assumir responsabilidades individuais ou coletivas, ele é o bode “expiatório”, sobre quem lançamos a culpa pelos efeitos maléficos das estruturas que montamos, das decisões que tomamos ou palavras irresponsáveis que proferimos.

Cada indivíduo ou segmento, de acordo com suas preferências epistemológicas, formação acadêmica, área de atuação ou forma como lida com os mistérios da vida, apresenta sua visão e versão. O fato, entretanto, é que há um fenômeno que, vez por outra, nos impulsiona para o mal.

A linguagem usada para identificá-lo ou a metodologia aplicada na tentativa de esclarecer as percepções a respeito dele – do fenômeno - são tão diferentes quanto insuficientes. Inegável é, porém, que há algo estranhamente maléfico, gerador de desconforto interior, afetos “estranháveis” e até profundos conflitos interpessoais e sociais.

Pedro, que o trata como adversário, diz que ele “anda ao redor como leão, rugindo e procurando a quem possa devorar” (I Pd 5.8). Tiago declara que a melhor maneira de vencê-lo é submetendo-se a Deus (Tg. 4.7).

A comunhão honesta, sincera, simples, humilde, sem máscara ou qualquer outro tipo de hipocrisia com o doador da vida, não impede que fenômenos “diabólicos” – não necessariamente místicos - continuem se manifestando ao nosso redor, mas, certamente, faz com que, interiormente, nos sintamos sem medo e prontos para enfrentar suas artimanhas.

Admitir e aceitar as próprias limitações e erros, agir de maneira graciosa e em plena confiança no amor de Deus é essencial para não temê-lo. No Criador, encontramos motivação e forças para lutar contra suas “armadilhas” e efeitos em nossas vidas, até porque, seja qual for a explicação, imagem ou o nome usados, não há como negar que ele continua, no mínimo relativamente, solto!

quinta-feira, 9 de abril de 2009

O Natal e a Ressurreição de Jesus

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Não parece, mas neste domingo comemoramos o dia mais importante da história da humanidade, pela ótica da fé cristã. Se comparado ao movimento do Natal, percebemos que é como se nada estivesse acontecendo. Por que isso ocorre?

Inicialmente, a natureza dos dois acontecimentos - nascimento e morte de Jesus – afeta de forma diferente a maneira como reagimos. Natal é nascimento, paixão é morte. No nascimento nos reunimos para comemorar, festejar, sorrir; na paixão, para chorar e lamentar. Natal é início de vida; paixão é fim.

Lidamos facilmente com o nascimento, mas o mesmo não ocorre com a morte. Não são muitas pessoas que pensam nela como parte da vida. Portanto, poucos se interessam em aprender a lidar com ela.

Mesmo se tratando de ressurreição, a ênfase dada à crucificação, à maneira brutal como Jesus foi morto é tão forte que impressiona muito mais do que a notícia da ressurreição.

Há ainda a dificuldade da mente humana de lidar com a ressurreição, pois é algo de difícil aceitação pelo que sabemos de decomposição do corpo humano. Há também estudiosos que colocam em xeque a historicidade da narrativa. Por isso, conhecer o escrito e admitir a possibilidade é razoável, mas empolgar-se, como no Natal, exige um elemento adicional chamado fé.

Reconhecemos que a história toda de Jesus - concepção, trajetória, morte, ressurreição e assunção – é atípica. Como, porém, teria dito Billy Graham, se ela não fosse real, nem por isso deixaria de ser divina, pois somente uma história divina poderia produzir os efeitos que a história de Jesus produziu e continua a produzir na vida dos que nela crêem.

Comemoremos, então, com gratidão, a ressurreição de Jesus. Ela é um indicador de que nossa esperança deve continuar viva mesmo diante dos fortes sinais de morte que nos cercam. Alegremo-nos porque ela reacende em nós a esperança de que nem mesmo a morte pode ser considerada como fim, quando aquele em quem depositamos nossa fé é senhor da vida.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Agindo dentro dos limites

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Um detalhe curioso, porém de grande importância, passa despercebido na leitura que fazemos da narrativa bíblica sobre José do Egito. Trata-se da palavra que ele diz à mulher de Potifar e da que Faraó diz a ele, por ocasião de sua posse como governador do Egito. Ei-las:

Ninguém desta casa está acima de mim. Ele nada me negou, A NÃO SER A SENHORA, porque é a mulher dele. “ (Palavras de José à esposa de Potifar, em Gen. 39.9)

Você terá o comando de meu palácio, e todo o meu povo se sujeitará às suas ordens. SOMENTE EM RELAÇÃO AO TRONO serei maior que você” (Palavras de Faraó a José, em Gen. 41.40)

Não acredito que Potifar, ao dar instruções e autoridade a José, precisou dizer que sua mulher não fazia parte do pacote. Prefiro crer que José não cedeu ao assédio da mulher do capitão por ser pessoa íntegra, ter consciência dos seus limites e ser disciplinado o suficiente para não ir além do que deveria.

Certamente José não tinha consciência, mas tal postura retratava, em miniatura, uma qualidade essencial em grandes líderes: ter consciência dos próprios limites e saber respeitá-los. Somente pessoas com espírito ditatorial acreditam que podem tudo. Daí sua dificuldade em participar de grupos nos quais os poderes são distribuídos e limites estabelecidos.

Penso que não foi difícil para José entender o recado de Faraó quando disse: “Somente em relação ao trono serei maior que você”. José sabia o que era ter limites e agir dentro deles. Sendo um igual em milhões de humano, sabia que nem sempre teria a última palavra. Sabia que seu limite terminaria quando começasse o de Faraó, da mesma forma que demonstrou saber seus limites por ocasião do assédio sexual, em relação aos limites de Potifar. Nesse quesito, portanto, estava preparado para liderar.

Não podemos tudo, nem somos responsáveis por tudo. Se quem trabalha comigo não está cumprindo bem suas atribuições, posso ajudar, se perceber abertura para tal, mas, jamais, querer gerenciar aquilo que não é da minha competência política, ainda que me sinta tecnicamente competente a fazê-lo.

Quando não nos é explicitado o que nos cabe fazer, usar o juízo faz bem. Quando sabemos quais são nossas atribuições, agir prudentemente dentro dos limites delas é melhor ainda.